as palavras são poucas
e nem sempre são verdades
mas às vezes escapam da boca
e ferem vaidades
as palavras corroem o íntimo
e o inominado
ácido removendo crostas
para todo lado
as palavras fogem desesperadas
das bocas solitárias
e são negadas nas madrugadas
mas continuarão retidas na memória
e o tempo não poderá abafá-las
as palavras são cruéis como guilhotinas
e não cegam seu fio pelas esquinas
mas são também doces como alfenim
quando sabem o caminho do sim
as palavras que se acomodam
aos corações acomodados
não removem montanhas
sequer obstáculos de areia
muitas vezes as palavras se atropelam
nas bocas insaciadas
e não alcançam ouvidos ou corações
são tão simples
tão inaudíveis e tão inacessíveis
as palavras são muitas para quem cala
quem guarda no silêncio a própria fala
são difíceis de averbá-las no futuro
mais ainda de vivê-las no passado
Publicado no Livro O olhar de Narciso, Prêmio Ceará de Literatura, 1993, publicado em 1995.
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